O Porto dos Dois Sonhos

Tudo que é sonho é efêmero

Por Jorge Aziz em 02/02/2025 às 12:26:51

Porto de Singapura

Havia uma cidade no litoral do Brasil onde dois sonhos se encontravam. Um, o da prosperidade infinita, impulsionada pelo mar e pelas promessas de uma nova infraestrutura portuária. O outro, um sonho esquecido, o de uma cidade que um dia fora chamada de "capital da esperança", mas que agora tropeçava em suas próprias sombras. Macaé, o polo do petróleo, prestes a se reinventar – ou a repetir sua tragédia.


Com o anúncio do TEPOR, vieram as promessas: "11 mil empregos na fase de instalação, 3 mil na fase de operação", "modernização da infraestrutura", "uma nova rota para a economia global". O discurso era sedutor. Políticos locais sorriam para as câmeras, gestores públicos desenhavam cenários otimistas em gráficos coloridos, e empresários lançavam projeções exponenciais.


Lá no fundo, porém, os trabalhadores da cidade murmuravam outro tipo de profecia. Eles já haviam visto esse filme antes. "Esqueceram de avisar os alemães", dizia um senhor na praça, rindo sozinho. Ninguém sabia exatamente o que isso significava, mas a expressão pegou.


No início, o sonho parecia se realizar. Máquinas gigantes chegaram à costa, caminhões rasgavam as estradas trazendo materiais, hotéis e restaurantes enchiam-se de técnicos e investidores estrangeiros. O dinheiro fluía como um rio caudaloso. A cidade pulsava de energia.

Mas os cálculos não incluíam o elemento humano.

Com a enxurrada de promessas, vieram também os especuladores. Os aluguéis dobraram. Depois triplicaram. Os pequenos comerciantes foram engolidos pelos grandes investidores, que compravam tudo à vista. A cidade, antes acessível, tornou-se uma metrópole onde o custo de vida corria mais rápido que os salários. Os trabalhadores, aqueles mesmos que construíram o porto, viram-se empurrados para os morros e periferias, onde o asfalto nunca chegava.

E então, o segundo sonho despertou. O pesadelo.

O cronograma do TEPOR atrasou. O orçamento estourou. O lobby político fez com que o projeto mudasse de mãos diversas vezes. Licitações suspeitas, auditorias nunca concluídas, empresas fantasmas. Enquanto isso, os investidores estrangeiros recuavam, esperando um ambiente mais seguro para colocar seu capital.

Os empregos temporários evaporaram. Os 11 mil operários foram demitidos em ondas, e a cidade, antes fervilhante, tornou-se um deserto de expectativas frustradas. Com o desemprego, veio a fome. Com a fome, o crime.

As ruas que antes eram iluminadas pelos outdoors do novo porto agora estavam dominadas pelas sombras do abandono. Os assaltos multiplicavam-se. Gangues surgiam, recrutando os filhos dos operários que haviam construído os pilares do sonho.

O governo estadual prometeu medidas emergenciais, mas os cofres já estavam vazios. A população se perguntava: "Onde foi parar todo aquele dinheiro?"

Um jornalista local, um dos poucos que ousavam falar abertamente, fez um levantamento e encontrou um padrão: as empresas responsáveis pelo TEPOR eram as mesmas que, décadas atrás, haviam construído as refinarias inacabadas do governo. Os mesmos nomes. Os mesmos esquemas. Os mesmos rostos, agora com cabelos grisalhos e contas bancárias muito mais robustas.

A ironia final veio quando a cidade começou a exportar seu produto mais recente: miséria. Quem podia, ia embora. Quem não podia, ficava para assistir ao espetáculo de mais uma promessa que virava pó.

Macaé, a cidade que um dia transformara petróleo em ouro, agora via seu ouro virar areia escorrendo entre os dedos.

O porto continuava lá, sua estrutura colossal um monumento ao que poderia ter sido. Alguns o chamavam de "Titanic de concreto", uma lembrança de que, às vezes, um sonho pode engolir outro e deixar apenas silêncio no lugar.


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